Divulgação de artigo: “Terapia ocupacional e adolescentes autores de ato infracional: mapeamento de produções”
O reconhecimento sobre a ação do terapeuta
ocupacional como executor das medidas socioeducativas vinculadas ao Sistema
Único de Assistência Social (SUAS) vem em uma crescente, porém as práticas
destes profissionais no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE)
ainda são pouco difundidas, notadamente nas medidas privativas de liberdade.
O SINASE é a política pública direcionada à
população de adolescentes (12 a 18 anos) que cometeu atos infracionais e foi
sentenciada ao cumprimento de uma medida socioeducativa, tendo como base
legislativa o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Como a sanção a ser
cumprida não possui prazo determinado, os adolescentes e jovens podem, até os
21 anos, estar vinculados ao sistema de justiça juvenil para o cumprimento das
medidas impostas. Estas têm como objetivo a responsabilização do adolescente
pela prática da infração, através de uma ação que deveria ser
preponderantemente pedagógica, voltada à educação e com foco na não
reincidência.
A legislação que rege as práticas direcionadas
aos adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas é definida por cada
país, sendo que internacionalmente a Organização das Nações Unidas (ONU)
direciona as discussões e produz documentos que norteiam as legislações e
normativas dos países consignatários, como no caso do Brasil.
Apesar da privação de liberdade estar prevista
no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo como último recurso a ser empregado, a internação de
adolescentes tem aumentado significativamente. Instituições são criadas para o
atendimento a estas populações, que contam com uma equipe de profissionais
responsáveis pela execução das medidas. De acordo com a legislação vigente, a
composição das equipes dos programas deve ser interdisciplinar, sendo o
terapeuta ocupacional descrito como um dos profissionais que pode compor esta
equipe.
Como a prática socioeducativa é bastante
singular, nos questionamos sobre o que tem sido produzido, no Brasil e no
exterior, acerca da atuação de terapeutas ocupacionais na atenção a
adolescentes autores de ato infracional.
Para isso realizamos uma busca de artigos, em
diferentes bases de dados e em periódicos de terapia ocupacional brasileiros
indexados.
Considerando que a terminologia utilizada para
a identificação da população é específica em cada país e está relacionada às
diferentes legislações (no Brasil, por exemplo, alguns termos mais utilizados
são: socioeducação, adolescentes em conflito com a lei, ato infracional, medida
socioeducativa, adolescente autor de ato infracional); foram selecionados diversos
termos correlatos à temática como descritores, o que possibilitou a
identificação de 513 artigos no período estabelecido (1985-2020). Após a aplicação
dos critérios de inclusão e exclusão, 13 foram os artigos foco da análise
aprofundada.
Como resultado deste levantamento e análise dos
artigos foi possível identificar que as produções mapeadas sobre a terapia
ocupacional e a execução das medidas socioeducativas foram escritas na língua
inglesa, no espanhol e no português, representando discussões e práticas de
diferentes contextos geográficos e temporais.
Dentre os artigos analisados encontramos a divulgação
de práticas realizadas nos Estados Unidos, Austrália, Brasil e Chile. A
investigação identificou que o referencial teórico considerado nas produções
esteve relacionado aos saberes e concepções de mundo e de terapia ocupacional,
sendo que as possibilidades de atuação profissional também se mostraram
relacionadas às características histórico-contextuais de cada localidade.
Neste sentido, diferentes foram os marcos de
referência e modelos de intervenção identificados nas produções. Além das
legislações específicas de cada país, utilizadas fortemente como orientadoras
na execução das práticas de justiça juvenil, múltiplos foram os modelos de
trabalho adotados por terapeutas ocupacionais. Tais modelos mostraram-se
fundamentados e representam, em maior ou menor escala, a compreensão que o
profissional possui sobre os sujeitos e a sociedade em geral. Dentre as
perspectivas abordadas, destaca-se: o Modelo de Ocupação Humana (MOH),
princípios da justiça ocupacional, práticas de adaptação ocupacional e também
os princípios da Terapia Ocupacional Social e dos Direitos Humanos.
Os artigos estadunidenses fundamentaram-se, em
sua maioria, no MOH e na adaptação ocupacional. As práticas do Chile e da
Austrália referenciaram a justiça ocupacional e as publicações brasileiras
fundamentaram-se nos direitos humanos e na terapia ocupacional social.
Estes fundamentos direcionam o foco da ação
profissional, sendo que através do mapeamento de produções identificaram-se
dois focos de intervenção mais difundidos para a prática com adolescentes nesta
situação: a terapia ocupacional como clínica da saúde ou como ação social.
No escopo de uma clínica da saúde, as
publicações mapeadas abordam práticas profissionais que se relacionam a
conceitos como prevenção de disfunção, manutenção e melhora da capacidade
funcional, aprimoramento de componentes sensório motor e cognitivo dos
adolescentes que cumprem a sanção socioeducativa, não relacionando ao contexto
social dos adolescentes. Em contrapartida, o que denominamos de ação
social, são artigos que apontam ações de terapeutas ocupacionais estruturadas
em questões macrossociais, com os profissionais identificados como agentes
políticos e sociais, compreendendo o fenômeno da prática de infrações por
adolescentes como resultado das diferentes interações sócio-históricas e as
inequidades sociais, criando o desafio, desta forma, da consecução de ações
social pelos profissionais.
Posicionamo-nos pela defesa de uma abordagem
social no trabalho com esta população, tendo como base os fundamentos da
Terapia Ocupacional Social, destacando seu papel na execução de uma política
pública, como no caso da socioeducação. Outras pesquisas na área precisam ser
continuadas/realizadas para que possamos fortalecer e difundir o conhecimento
sobre a especificidade profissional nestes contextos.
Convidamos a todas(os) para a leitura do artigo
disponível no link: https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAR2218
Referência:
OLIVEIRA, Renata
Hoeflich Damaso de; MALFITANO, Ana Paula Serrata. Terapia ocupacional e
adolescentes autores de ato infracional: mapeamento de produções. Cadernos
Brasileiros de Terapia Ocupacional, v. 29, 2021.
Texto escrito
por: Renata Oliveira e Ana Paula Malfitano
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